Neste mês celebrou-se o dia da gestante e muitas fotos lindas de mulheres grávidas correram as redes sociais. Uma potência de vida em cada foto, em cada história. Minha experiência com a gestação, foi um pouco diferente.
Em um país que tem as mais altas taxas de cesáreas do mundo (55% dos nascimentos), precisamos conversar sobre violência obstétrica, fato que acontece há décadas na América latina. O que está muito presente entre as gestantes é a falta de informação e o medo de perguntar sobre o parto e sobre tudo que ele envolve.
A violência obstétrica atinge 25% das mulheres do país, seja na hora do parto, seja no pré-natal. Dessas, 62,8% são negras. Não há pesquisas sobre mulheres gordas. Mas basta conversar com várias ou ler relatos nas redes sociais para entender o drama.
Enquanto boa parte das mulheres tem uma gestação acolhida, a mulher gorda é sempre vista com certa desconfiança: “como ela pode estar grávida?” “Será que está grávida ou gorda?”. Quem a assiste muitas vezes não sabe explicar que ela irá demorar pra sentir o bebê, para que a barriga apareça e que ela pode, sim, ter um filho de parto normal ou natural.
A cesariana entra como salvação e saber médico. Nada é conversado com a paciente. Falo isso por experiência própria: internei, fiquei horas esperando a cesárea de emergência e ninguém (da equipe médica) conversou comigo sobre tudo que viria a seguir. Detalhe: eu nunca havia passado por uma cirurgia na minha vida e informei isso a minha obstetra.
É importante relatar que a pessoa que eu era, não sou hoje. Hoje entendo que boa parte dos traumas que tenho em relação à cirurgias e a não desejar outro filho vieram dessa experiência. Me curo todos os dias ao fazer as pazes com esse corpo que me trouxe até aqui. Tive minha saúde mental completamente ignorada e parecia que somente meu corpo era enxergado. Peraí: meu corpo, não. Minha gordura e meu IMC. E até hoje isso não mudou.
Fico sempre pensando, quando a medicina se tornará efetivamente humana? Quando serei olhada para além do corpo? E serei realmente escutada?
Hoje vejo como tudo aquilo impactou minha experiência como gestante e no meu puerpério. Poderia ter sido um período muito mais rico e repleto de aprendizados, no entanto, essas não são as minhas memórias. Lembro do sofrimento, do medo, da angústia e das pressões, inclusive em perder peso. E creio que se conversarmos com muitas mulheres gordas, teremos relatos parecidos. E eu sou grata ao meu privilégio de ter uma irmã enfermeira. Isso fez toda diferença durante o período.
Face a tudo isso, é cada vez mais fundamental que possamos criar espaços de escuta e compartilhamento de saberes para o enfrentamento de questões relacionadas ao tema. Ter macas e equipamentos ideais faz a diferença. Entender os estigmas construídos sobre o corpo feminino também. Valorizando, assim, o acesso à saúde de todo cidadão de forma igualitária e equânime. Somos plurais, assim como é plural a nossa forma de cuidar da saúde.
“A nossa potência está na pluralidade de ser quem somos e construir caminhos singulares para re-existir.” (Carla Pepe)